terça-feira, 25 de setembro de 2012

CINQUENTA TONS DE CINZA

Caracterizada pelos processos que se desdobram junto a sociedade de massa a partir do século XX, a Pop Art questiona, entre outros aspectos , os caminhos em que não só as mercadorias, mas também o próprio corpo humano foi reduzido a condição de objeto. Na eloquente obra de Richard Lisner, as diversas pigmentações e formas geométricas das anatomias compôem corpos suprarecortados-como é notável no fenônemo da atual medicina de consumo baseada em cirurgias plásticas, implantes capilares e drogas para moldar o físico e atuar a vida sexual -dos quais se extraiu sua naturalidade dando lugar a um conjunto rígido que evidencia suas desproporções , especialmente quanto ao exagero dos quadris da alegoria feminina e sua cabeça exígua coberta por longa cabeleira acinzentada. Neste cenário, manifestam-se evidentes contradições pelas quais essa sociedade de massa estabelece a valorização da autenticidade de um objeto da indústria do luxo, como denomina Marx Weber-ao mesmo tempo que não se incomoda se o seio , o nariz ou as nádegas foram produzidos pelas ténicas de um bisturi e portanto limitam-se a trágica condição de uma imitação. Em outras palavras:exige-se a legitimidade da mercadoria (por exemplo, de uma bolsa de grife),mas admite-se o postiço do próprio corpo. Na imagem, homem e mulher emoldurados por cores frias e olhares distintos, direcionados por ângulos que não se encontram , refletem os desajustes causados pela esmagadora alienação. Seus rostos perdem a identidade de suas autênticas linhas de fisionomia e mais se assemelham a máscaras e caricaturas. Dessa forma, a sujeição a este individualismo narcisita deturpa a condição do ser humano que pela visão de Merteau-Ponty ,"vai encarcerá-lo" e promove cada vez mais a inversão do papel do corpo: ao invés de manifestar-se como pelo qual alcançarmos a liberdade e o prazer , declinar-se para um calabouço de si mesmo , pelo qual sofre-se ainda mais em função da normalização das formas para o alcance do ideal de ser sempre artificialmente jovem, esbelto e dinâmico.
Obra: Couple
Autor: Richard Lindner

Nenhum comentário:

Postar um comentário